Solicita-me a discente Ines Germano que coloque o seguinte texto que, mais uma vez, está delicioso:
"Café ou chá? Penso eu antes de chamar o empregado do bar! Se a minha mulher cá estivesse já estava a pensar que ainda fiquei com algum poder de decisão, mesmo depois de ser decretada a minha inabilitação.
Por fim escolho chá, chá de camomila para ver se me acalmo, se me relaxo. Desde que me declararam inabilitado sinto uma certa angústia, uma certa falta de liberdade, liberdade de escolha e de opinião também. Agora deixei de trabalhar, também já não me sinto útil, a minha esposa achou melhor afastar-me do cargo que eu ocupava na MINHA empresa, pois poderia delapidar o nosso património e comprometer o futuro dos nossos filhos. Ela adora dizer isto quando vamos a qualquer sítio e me perguntam como vai o trabalho.
De facto sei que de à uns meses a esta parte não me tenho sentido bem, tenho umas certas conversas comigo próprio, com o meu eu interior, que a minha mulher logo se apressou a chamar esquizofrenia.
Eu sei que gosto de falar sozinho, não bem sozinho, é comigo e com o boneco de porcelana da entrada, mas lá por isso não quer dizer que seja maluco e que tenha a tão falada esquizofrenia.
No entanto só eu acho isso, fui a vários psiquiatras, todos caríssimos por sinal, para ver o que se passava, mas todos compartilharam a opinião com minha esposa. Mais tarde surgiu a ideia de me inabilitarem, pois vendi umas acções que tinha à um tempo a baixo preço, mas só fiz tal negócio porque sabia que elas um dia iriam descer, mas isso foi a gota de água, daí nasceu o processo de inabilitação e depois a tão temida sentença. Depois da sentença lida, reuniram-se todos em conselho de família e decidiram que a senhora minha esposa ficaria com o papel de minha curadora, um género de assistente, facto a que não achei muita piada, mas teve de ser.Sabem por que me sinto tão mal com tudo isto? Porque sempre fui habituado à minha liberdade, ao meu trabalho e agora de repente fiquei sem nada, passo os dias no golfe e no sofá, a Dulce diz-me que só estou afastado temporariamente e que todas as decisões importantes passam por mim, mas não é a mesma coisa. Se desde que nasci me devessem detectado algum problema, tudo bem, mas agora depois de velho, já me parece demais, se tivesse nascido assim não teria qualquer inconveniente, pois nunca teria conhecido o sabor da verdadeira liberdade, até aos 18 anos era defendido pela lei da menoridade e logo em seguida pela lei da interdição, teria um tutor e não tinha nada com que me preocupar, mas assim depois de conhecer o gosto de pôr e dispor da minha vida é muito complicado…"
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